Será que alertas de gatilho em livros fazem a diferença?

setembro 09, 2022

Se você tem acompanhado as demandas dos novos leitores, com toda certeza já ouviu falar sobre “Alerta de gatilho” ou “Trigger Warning (TW)”.

São avisos que aparecem em postagens nas redes sociais, séries de TV, filmes e, até mesmo, livros. O objetivo é alarmar a audiência sobre conteúdos sensíveis como violência explicita, crimes de ódio e abusos sexuais, que podem despertar algum tipo de desconforto ou até mesmo dar início a uma crise emocional. 

Estes avisos permitem que a audiência decida se vai ou não se expor ao determinado conteúdo e pode ser de extrema importância para saúde mental.

Um exemplo da relevância dos Trigger Warnings no Brasil pode ser vista por meio da mudança nas classificações de filmes e séries e a iniciativa para fazer o mesmo com livros. Anteriormente, só se indicava a idade ideal do produto. Agora, depois da Lei instaurada em 2018, descrições que alertam para temas fortes retratados nas obras são exigidas.

Contudo, a presença de alerta de gatilho nos mais diversos conteúdos ainda é um assunto polêmico que divide opiniões. 

Por mais que os alertas sejam vantajosos para que determinadas pessoas não sejam expostas a conteúdos mais sensíveis, alguns especialistas defendem que estes podem acabar reforçando comportamentos de fuga ou evitação a qualquer tipo de desconforto.

Neste artigo, vamos apresentar um pouco mais sobre este assunto importante para literatura e para o setembro amarelo.

Mas, o que seria um gatilho emocional?


O conceito de gatilho emocional pode ser definido quando qualquer coisa como: pessoas, palavras opiniões ou situações, desencadeiam uma reação emocional intensa e excessiva, fazendo com que a pessoa recorde de uma experiência traumática que teve. 

É como se a pessoa passasse novamente pelo seu trauma, podendo causar raiva, tristeza, ansiedade ou medo.

Além dos gatilhos serem utilizados para o Transtorno de Estresse Pós-traumático (TEPT), também podem acontecer na esfera de outros transtornos mentais, como ansiedade e depressão.

Um exemplo prático que podemos dar é quando uma mulher que passou por uma violência doméstica faz a leitura de um livro que tem diversas cenas explicitas com esse tipo de conteúdo e acaba lembrando de forma excessiva do seu próprio trauma, revivendo sentimentos ruins dentro de si.

Os gatilhos são diferentes para cada um e podem ocasionar reações diversas de acordo com cada história. 

Imagem: Shutterstock

Segundo o psiquiatra Neury José Botega em entrevista para o Jornal Digital GHZ, conteúdos de ficção podem atingir pessoas vulneráveis porque neles ocorre um processo forte de identificação com os personagens, ao mesmo tempo que certos livros também podem acabar estimulando a conversa com um terapeuta ou a busca por ajuda. 

Ele acredita que em alguns casos, o alerta de gatilho substitui informalmente a classificação indicativa e vice-versa.

Avisos de gatilhos são eficazes?


Pesquisas sobre a eficácia dos gatilhos mentais ainda estão no começo, já que o tema se trata de algo novo ainda para literatura e o cinema.

No entanto, já existem alguns estudos feitos por universidades e pesquisadores da psiquiatria que tem tentado entender se os avisos realmente fazem a diferença para saúde mental das pessoas.

Pesquisas de universidades na Nova Zelândia, Austrália e em Harvard se destacam. No caso do estudo realizado em na Nova Zelândia e na Austrália, foi visto que as pessoas que foram expostas aos conteúdos com alertas tiveram reações parecidas as que não foram avisadas.

E no estudo divulgado pela Universidade de Harvard, a conclusão foi de que os gatilhos poderiam aumentar a ansiedade de sobreviventes a traumas.

Christian Jarrett, neurocientista cognitivo e escritor de ciência, afirma em artigo publicado pelo Jornal Nexo em 2020 que nenhum dos estudos recentes focou no seu uso entre pessoas com diagnósticos de transtornos mentais.

Porém, mesmo assim, evidencia que os resultados são consistentes em minar a declaração específica de que os avisos de gatilho permitem às pessoas engajar algum tipo de mecanismo de defesa mental.

Imagem: Pexels

Ele complementa que existe uma base de evidências sólidas de que a fuga é uma estratégia danosa para pessoas em recuperação de traumas. “A mensagem clara da psicologia é de que avisos de gatilho não vão fazer muito, além de encorajar estratégias de sobrevivência insustentáveis e a crença de que as pessoas são sensíveis e precisam de proteção.”

Psiquiatras que estudam TEPT afirmam que uma quantidade enorme de coisas pode acabar desencadeando gatilhos em um indivíduo, tornando-se difícil prever quais conteúdos e cenas em cada livro poderiam ser consideradas sensíveis.

Todavia, defendem que algumas temáticas que tratam de agressões explicitas são mais universais o quanto a sensibilidade e podem acabar causando mais desconforto por quem consome.

A Letramento acredita que o alerta pode ser positivo se seu efeito não for diluído caso aplicado em situações em que ele não é necessário. 

O aviso de gatilho tem limitações, mas se autores, produtores e editoras forem usá-lo, devem entender a importância de não generalizar em excesso e se atentar a temáticas sensíveis de forma empática, permitindo assim que as pessoas escolham os conteúdos que vão consumir de acordo com sua disposição.

Acreditamos que sempre deve ser uma escolha. E caso esta seja a sua, existem sites colaborativos por aí em que leitores cadastram livros e listam gatilhos que encontraram por lá para informar outros possíveis interessados na obra. O acervo é bem grande e tem uma enorme variedade de obras.

Conheça o Book Trigger Warnings e Trigger Warning Database.

Nos dois casos, é só pesquisar o título do livro que o site lista todo o conteúdo que pode vir a ser um gatilho para você.


O movimento Setembro Amarelo, mês mundial de prevenção do suicídio, iniciado em 2015, visa sensibilizar e conscientizar a população. Visite www.setembroamarelo.org.br e saiba mais <3


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