Representatividade na Fantasia

junho 30, 2021

Por Gustavo Silva

 

Wakanda para sempre


A apoteótica revolução que o filme Pantera Negra trouxe para toda a comunidade preta ao redor do mundo foi arrebatadora. Transformando e alavancando a auto estima de muitos de nós, pautando nas redes sociais a importância da representatividade nos blockbuster


Atores pretos fazendo papel de destaque nas telonas, sem qualquer estereótipo racista herdado dos tempos colônias. Adultos chorarem e crianças se inspiraram naquele maravilhoso mundo. Me lembro de sair da sala de cinema e assistir crianças pretas – como eu fui um dia - gritando “wakanda para sempre”  pelos corredores do shopping. As lágrimas escorreram pela segunda vez naquele dia. 


Na época que o filme foi lançado, o universo de Guerreiros de Koulon começava a ser construído como uma trilogia e não mais apenas como livro único. O roteiro dos personagens estava feito, a minha Wakanda começava aos poucos ganhar páginas. 





Li alguns quadrinhos do Pantera Negra na adolescência, mesmo naquela época meus olhos encheram de lágrimas ao ver um herói parecido comigo. Enfim, Pantera Negra me inspirou a criar o meu Congo Unificado. Queria que Mbanza, Nzuque, Alazã e Abuja fossem tão poderosas quanto aquele país fictício. 


E para criar a Wakanda e suas tecnologias, os roteiristas Ryan Coogler e Joe Robert Cole, colocaram suas visões do universo criado por Stan Lee e Jack Kirby das HQs: usaram a História massacrante de ancestrais sequestrados em uma empolpeia de vozes gemidas e magoadas. Obras fantásticas, por mais utópicas que possam parecer, podem acender uma luz dentro de alguém e acabar servindo de inspiração para outras pessoas criarem histórias - além da dor daqueles que estiveram antes de nós.


A história dando palco a fantasia


Os roteiristas de Pantera Negra não foram os únicos a usar a História para ajudar a criar suas narrativas ficcionais. A autora polonesa Sarah Cohen-Scali usou a história da Segunda Guerra Mundial como plano de fundo para narrar, em primeira pessoa, o relato de uma criança nazista. Personificando em uma escrita ácida e diabólica, a obra conta  a trajetória de Max, um menino que desde o ventre de sua mãe pensa como um nazista. Até que tudo muda ao conhecer um menino judeu chamado Lucas. 


No livro de mesmo nome que o do protagonista, a autora mostra como o projeto batizado de “Lebensborn” afetou mulheres e crianças nascidas com a crença de uma raça pura. A autora usa a história do projeto, iniciado em 1939, como um trampolim mergulhando o leitor em um relato ficcional. Uma obra que ao ler me senti mal por alguns dias. Hoje, o livro descansa em minha prateleira e, ao olha-lo, sinto os mesmos arrepios de quando senti ao vê-lo na livraria. 


Foi quando a minha linha do tempo foi traçada. E uma luz surgiu na cabeça. Historicamente, a Europa atravessava durante séculos guerras por recursos e territórios. O continente africano passava pelo problema, e assim como os Europeus a sociedade de muitos países do continente tinham, uma filosofia própria, um modelo social que para os europeus não fazia sentido naquela realidade. 


A linha do horizonte, aos poucos, chamava a atenção de muitos exploradores marítimos. Foi então que, aquele continente recheado de filosofia, religião, e com suas leis próprias, passou a ser controlado por imperialistas e traficantes de escravos transformando algo que era significativo  para povos milenares em espórios - que estampam as vitrines dos museus em muitos países por toda a Europa, longe de seu pais de origem.


O Congo foi um dos últimos países a ser colonizado, enquanto Portugal, Espanha, Inglaterra e França lutavam por um pedacinho do continente africano. A Bélgica não quis se envolver naquela corrida, porém, algo na região congolesa chamava atenção do até então rei Leopoldo II. Leopoldo foi o responsável pelo genocídio de milhares de congoleses transformando aquele imenso pedaço de terra em uma enorme fazenda particular em meados de 1885. 


Guerreiros de Koulon


 Na minha obra, Guerreiros de Koulon, Miguel Albuquerque é um dos sobrinhos do rei Leopoldo, que assim como parte de sua familia, enxerga subserviência dos povos originários como uma forma de enriquecer ainda mais. A recente colônia estabelecida de Portugal é a oportunidade sair da influência de sua familia. 


Filho de uma aristocrata portuguesa com um belga, Miguel junto com seu primo Antônio embarcam rumo as desconhecidas terras do Congo Unificado e, a partir daí, o rumo da história de todo o Congo Unificad e, principalmente, de Nioré Motubá muda por completo. Miguel é o vilão que eu odiei de escrever, não apenas por mexer com feridas minhas, mas sim porque existe muito de Miguel Albuquerque em muitas pessoas da sociedade brasileira.  





A literatura fantástica junto a História, consegue transformar e inspirar escritores em sua narrativa. Guerreiros Koulon Vol1: Cidade Castigo é uma dessas inspirações. Com referências, históricas e da mitologia Iorubá, busco no livro construir uma narrativa coesa ao longo das páginas devolvendo o que Pantera Negra fez por mim durante anos: inspirar cada vez mais histórias de fantasia com representatividade.


Laroyê. 



Curtiu conhecer um pouco mais por trás da história da idealização de Guerreiros Koulon Vol1: Cidade Castigo? Me conta nos comentários e não deixa de conferir a pré-venda do livro em nosso site <3

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